Os israelenses vão às urnas pela quarta vez em dois anos. Novamente, a campanha gira em torno de Netanyahu, como um referendo de seu governo. Mas agora o premiê tem a gestão da pandemia como trunfo
Há duas semanas, Nuriel
Zarifi conseguiu reabrir totalmente seu café em um bairro residencial de
Jerusalém. Até então, devido à pandemia, ele só estava vendendo para consumo
fora do recinto. Mas agora, cadeiras e mesas estão novamente disponíveis aos
clientes.
Após três longos lockdowns
e com quase metade da população totalmente vacinada, Israel conseguiu promover a reabertura da sociedade – pouco antes das
eleições parlamentares desta terça-feira (23/03).
"Algumas vezes eu
pensava: não aguento mais, não vou votar", diz Zarifi. "Mas depois
vejo todo esse ódio contra Netanyahu, contra o que quer que ele faça, e não
acho isso bom. Isso me levou a votar nele." O proprietário do café
continua sendo um apoiador de longa data do partido conservador Likud e seu
líder, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
Os israelenses irão às
urnas pela quarta vez em dois anos. O último governo de união, liderado por
Benjamin Netanyahu e Benny Gantz, do Partido Azul e Branco, entrou em colapso
em dezembro. Desta vez, ainda mais do que nas três ocasiões anteriores, a
eleição é vista em grande parte como um referendo sobre Netanyahu.
Netanyahu, que está atualmente
sendo julgado sob acusações de corrupção, se mantém no poder há 12 anos e se
tornou uma figura cada vez mais polarizadora na política israelense. Mas isso
parece não incomodar Zarifi.
"Algumas pessoas me
dizem: por que você não vota pela mudança? Por Yair Lapid ou Gideon
Saar?" comenta ele, referindo-se a alguns dos principais desafiadores de
Netanyahu nesta eleição. "Eu só digo que fechem os olhos e vejam se este
cara pode liderar o país. Quando fecho meus olhos, vejo Netanyahu. Eu me sinto
mais confortável. Como no início da crise do coronavírus, quando eu senti que
podia contar com ele. Ele comprou as vacinas, ele escolheu a vida."
Referendo sobre Netanyahu
Embora muitos israelenses
deem crédito a Netanyahu por ter comprado as vacinas, a gestão da pandemia pelo governo foi bastante
criticada no ano passado. Muitos também pediram a sua renúncia por causa das
acusações de corrupção. Entre eles estava Maya Rimer, que participa
regularmente dos protestos antigoverno que ocorrem semanalmente no país.
Para Rimer, a eleição é
mais do que a questão da vacinação. "Gostaria de ver os políticos
realmente nos servindo, e não a eles mesmos", diz Rimer. A jovem
israelense espera que esta eleição traga uma mudança real no governo, e não
apenas a abertura de outra eleição. "É a quarta eleição e não parece que
vai ser a última. Não parece que vai ser resposta para nada",
complementa.
As últimas pesquisas
projetam que o partido Likud, de Netanyahu, permanecerá o mais forte, com entre
29 e 32 dos 120 assentos no Knesset, o Parlamento de Israel. Isso daria a
Netanyahu uma pequena vantagem para a construção de uma coalizão. Dois blocos
principais competiriam então para formar o próximo governo de coalizão, mas
ainda não parece haver para nenhuma legenda um caminho claro rumo
à maioria necessária de 61 assentos.
Espera-se que Netanyahu se
volte para seus aliados naturais, os partidos ultraortodoxos e, desta vez, a
pequena aliança do sionismo religioso de extrema direita. No entanto, essa
aliança precisaria potencialmente do apoio do partido de direita Yamina, cujo
líder Naftali Bennett permanece ambíguo sobre se juntar a uma coalizão com o
primeiro-ministro. Netanyahu também cortejou eleitores árabes-israelenses do
pequeno partido separatista Lista Árabe Unida.
Embora a campanha
eleitoral de Netanyahu tenha abordado os acordos de paz que ele fez
recentemente com os Emirados Árabes Unidos e Bahrein, foi a tão desejada
campanha de vacinação contra a covid-19 e a reabertura da economia que lhe
renderam mais elogios. Quase 50% da população total de Israel já foi
totalmente vacinada, e a memória dos três rigorosos lockdowns parece estar
desaparecendo.
"Cento e oitenta
primeiros-ministros e presidentes ligaram para Pfizer, Moderna; eles não
atenderam às chamadas, eles atenderam à minha chamada", disse Netanyahu na
semana passada. "E eu os convenci de que Israel seria o modelo de sucesso
para as vacinas. Mas quem vai continuar a fazer isso? Não vai ser Lapid, nem
Bennett, nem Gideon. Eles simplesmente não podem, eu posso."
"Qualquer
um, menos Netanyahu"
Em contraste, seus
principais desafiantes têm como campanha o lema: "Qualquer um, menos
Netanyahu". Esses partidos vêm principalmente da direita ou do centro
político, mas todos eles são liderados por candidatos que já foram ministros em
um governo Netanyahu.
O mais importante entre
esses adversários é Yair Lapid, líder do centrista Yesh Atid (Há um futuro),
que Netanyahu destacou como seu principal oponente durante a campanha. Lapid, o
atual líder da oposição, fez uma campanha em tom moderado, focando em questões
de democracia, economia e gestão da pandemia pelo governo.
As últimas pesquisas
projetam entre 18 e 20 assentos para o Yesh Atid, mantendo seu lugar como
segundo maior partido depois do Likud. Na semana passada, Lapid alertou os
eleitores: "Ainda há um número sem precedentes de pessoas que estão
indecisas, mais de dez assentos em jogo. Elas precisam saber que, se não
votarem no Yesh Atid, teremos um governo sombrio, racista, homofóbico e
extorsionista. No final, precisamos de uma grande força para provocar
mudanças."
Enquanto isso, mais à
direita está Gideon Saar, ex-Likud. No entanto seu partido, Nova
Esperança, parece ter captado apenas um dígito de apoio nas pesquisas de
popularidade.
E há ainda Naftali
Bennett, líder do partido religioso nacionalista Yamina e ex-ministro da
Educação e Defesa sob Netanyahu. Ele desafiou abertamente a liderança de
Netanyahu, mas não descartou a possibilidade de se juntar a uma coalizão com
ele.
"Hoje temos três a
quatro líderes do campo anti-Netanyahu", diz o cientista político Maoz
Rosenthal. "Se vocês estiverem juntos, mas divididos, a capacidade de
cooperar e de formar uma coalizão é muito limitada. Essa é a complexidade desta
eleição."
Depois que as seções
eleitorais fecharem na terça-feira, às 22h (horário local), os canais de TV
israelenses terão as primeiras bocas de urna. O Comitê Central Eleitoral de
Israel alertou que a contagem dos votos deve levar mais tempo do que o normal,
devido às precauções relacionadas à pandemia e ao fato de que seções eleitorais
especiais serão abertas para acomodar pacientes da covid-19 e eleitores em
quarentena.
Mas quando o foco se
voltar para as consequências das próximas eleições, a perspectiva de outro
período difícil de negociações da coalizão, um possível impasse ou mesmo uma
quinta eleição ocupará mais uma vez a mente de muitos eleitores
israelenses.
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